Filhos ou órfãos
Rm 8.14-17; Gl 3.26-4.7
Introdução: Uma
das doutrinas mais grandiosas do Evangelho e também uma das mais facilmente
esquecidas é a de nossa relação com Deus. A Bíblia nos diz que "fomos
feitos filhos de Deus", mas facilmente nos esquecemos que somos filhos, e
desenvolvemos uma mentalidade de órfão. Uma das razões para este desvio são as
experiências nos nossos relacionamentos e na nossa história: Gente que já teve
experiência de rejeição, tende a desenvolver um sentimento de orfandade, e
encontra dificuldade para se sentir amado. Filho rejeitado pode perder o
vínculo afetivo. Criança indesejada eventualmente tem dificuldade relacional.
O chamado que recebemos de Deus em Cristo
Jesus é o chamado para sermos filhos. Várias vezes na Bíblia vemos a expressão
"Deus nos adotou". A Bíblia diz que embora todos sejamos criaturas de
Deus, nem todos são filhos de Deus (Jo 1.12). Ser filho é assumir a condição de
uma família, com todos os direitos e deveres que ela tem. Infelizmente nossa
alma facilmente desenvolve uma idéia de luto existencial, de abandono de Deus,
de distanciamento do Pai.
Neste texto de Romanos, Paulo descreve as
conseqüências em nossa alma:
1.
Quem
não é filho, cria uma relação de escravidão – "porque
não recebestes o espírito de escravidão" (Rm 8.15). Paulo tenta trazer
à mente do povo de Deus, que sua relação com Deus agora em Cristo, é totalmente
diferenciada. Não mais escravos, mas filhos.
Embora vivendo com Deus, nem sempre o vemos
como Pai. Muitas vezes se parece mais com alguém punitivo, que exige uma cota
diária de tarefas a serem preenchidas, e que pode nos castigar e retirar alguns
privilégios nossos se não fizermos exatamente o que ele espera. Esta mentalidade
que se fundamenta na funcionalidade, contudo, não é a de um Pai com um filho,
mas de um servo com seu senhor.
2. Quem não é filho, vive numa
insegurança marcante – Paulo usa a idéia de medo. "porque
não recebestes o espírito de escravidão para viverdes, outra vez,
atemorizados" (Rm 8.15). É bom grifar a palavra "atemorizados".
Quem já passou por situações de ameaça e medo, sabe do que estou falando. A
Bíblia fala que "no amor não existe medo; antes, o perfeito amor lança
fora o medo. Ora, o medo produz tormento; logo, aquele que teme não é
aperfeiçoado no amor" (1 Jo 4.18). Amor e medo, são exclusivos. Se
nossa relação com Deus é fundamentada no medo, algo muito grave ronda nossa
experiência com Deus. O medo produz tormento. Se este sentimento permeia nossa
vida, isto revela nossa impossibilidade de crescermos em maturidade, já que
quem teme não é aperfeiçoado no amor.
Se este texto descreve o que vai na alma do
órfão, também aponta para os privilégios daquele que é e se sente filho:
1.
Filho
participa dos direitos da família – Tenho convivido com algumas
famílias que adotaram filhos. Uma unanimidade entre todos eles é que não existe
diferença entre o adotado ou legitimo. Trata-se de algo relacional, não de algo
uterino. Um dos casais dizia sempre ao seu filho adotado: "você nasceu no
coração do papai e da mamãe". Paulo diz isto aqui neste texto: "se
somos filhos, somos também herdeiros" (Rm 8.17). Herdeiro tem
direitos, não vive à margem do processo familiar. É inserido no cotidiano e nos
privilégios familiares.
Adoção é
um ato de Deus, efetuado pela sua graça, pelo qual participamos de uma nova
família espiritual, que não se define institucionalmente, mas pela maravilhosa
operação do Espírito Santo. A Confissão de fé de Westminster diz: "Todos os que são justificados, em e
por seu Filho Jesus Cristo, são feitos
participantes da graça da adoção da liberdade e do privilégio de ser
filho de Deus e recebe o espírito de adoção"(Confissão de fé de
Westminster, cap. XII).
Ser
adotado traz vários privilégios. Por meio desta obra de Deus a nosso favor,
recebemos o Espírito de adoção (Rm 8.15), isto é, uma nova mentalidade é
colocada em nós, não mais de escravo, mas de filho. Este é o espírito de
adoção. Podemos encontrar intimidade e aconchego, chamando o Deus Todo Poderoso
de "Paizinho" (Abba Pai) (Rm 8.15; Gl 4.6). Por meio da adoção, nos é
dado acesso direto à presença do Pai (Gl 4.7) e ainda recebemos herança na
família de Deus (Rm 8.17). Além disto, João afirma que "Ainda não se manifestou o que havemos de ser" (1 Jo 3.2). Isto é, o que sabemos já é
grandioso, mas existe muita coisa
maravilhosa que ainda não nos é dado conhecer.
2. Filho desenvolve senso de família –
Tem um senso de pertencer a uma estrutura doméstica. Percebe pai, mãe, filho.
Certo amigo meu, na sua adolescência teve uma briga séria com sua irmã. Seu
Pai, então, interfere no conflito e diz aos dois: "vocês precisam se
reconciliar, porque vocês, mesmo que queiram, não poderão deixar de ser
irmãos". Algumas perguntas fundamentais devem ser feitas: "tenho
família? Percebo irmandade na minha existência? Encontro aconchego e ninho na
minha vida?".
Pela
adoção, os laços com a velha família são quebrados: somos resgatados da lei
(Gl.4:5); da escravidão (Rm 8.15); das futilezas que cercavam a nossa vida (1
Pe 1.18); e da maldição familiar (Ex 20.5). Pela adoção, um novo ambiente
familiar é estabelecido.
3. Filho vivencia intimidade e liberdade –
Uma das cenas mais marcantes na história do povo americano é aquela em que John
Kennedy está despachando no salão oval da Casa Branca, e seu filho, John-John
está brincando debaixo da mesa, ignorando que seu Pai é um dos homens mais
importantes do mundo. Para aquela criança, seu pai não é estadista, nem
presidente, nem chefe, ele é apenas pai. Sua relação com ele é simples assim.
Neste texto, Paulo afirma que por recebermos
este espírito de adoção, podemos afirmar, "Aba, Pai" (Rm
8.15). O termo "Aba" não é hebraico, mas aramaico. Era uma forma
carinhosa e intima de se referir ao pais, mas uma linguagem própria de crianças
que estão começando a andar e a falar. É o equivalente ao nosso termo
"paizinho". Esta visão de Pai era escandalosa para os judeus
ortodoxos. Como é que podem chamar Deus de "paizinho"?
A fonte da adoção
é o amor e a iniciativa do Pai - I Jo.3:1
Ser filho, também traz responsabilidades, duas delas são significativas
- A responsabilidade de viver no status de filho. Temos que viver como família de Deus. Por isto Jesus afirmou: "Sede perfeitos como perfeito é vosso Pai" (Mt 5.48). Somos convidados a viver este novo estilo de vida. "Como filhos da obediência não vos amoldeis às paixões que tínheis anteriormente" (1 Pe 1.14).
- Compromisso com o funcionamento da nova família -"Vivei de modo digno da vocação a que fostes chamados" (Ef 4.1)
Conclusão:
A Bíblia é bem clara que todas as pessoas são criação de Deus
(Colossenses 1:16), mas que apenas aqueles nascidos de novo são filhos
de Deus (João 1:12; João 11:52; Romanos 8:16; 1 João 3:1-10).
Em Cristo,
Edmilson Santos
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